Para suprir grave omissão da reforma da previdência, a Proposta de Emenda Constitucional 270/2003 (PEC 270/2003), aprovada depois de quase 9 anos de tramitação, deu origem à Emenda Constitucional 70/2012 (EC 70/2012), resgatando aos servidores públicos aposentados por invalidez a paridade e a integralidade de que eram destinatários quando ingressaram nos cargos efetivos.
Há dois grandes regimes previdenciários no Brasil, o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), administrado pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), e o regime próprio de previdência social (RPPS), administrado pela União e demais entes federativos.
Ao RPPS estão vinculados os servidores estatutários, leia-se: servidores que não são regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), mas por regimes jurídicos específicos criados por lei, a exemplo da Lei 8.112/90.
Até a publicação da Emenda Constitucional 41/2003 (EC 41/2003), tais agentes públicos tinham direito à paridade (reflexos das alterações das remunerações na atividade) e integralidade (proventos com base na última remuneração). Depois da reforma, aqueles que ingressaram no serviço público até 31/12/2003 mantiveram tais garantias, com ajustes de transição, menos os que se aposentaram por invalidez.
A injustiça foi evidente, tanto que gerou a PEC 270 em 2003, mesmo ano da aprovação da EC 41, constatando-se que no momento mais delicado de um grupo de servidores que não desejaria se aposentar, mas vencer a doença, esses trabalhadores receberiam os proventos mais baixos que em qualquer outra situação.
Agora, resgatou-se a dignidade dos rendimentos dos aposentados por invalidez que entraram no serviço público até a data de publicação da EC 41/2003, ou seja, até 31/12/2003. Na modalidade de benefício por doença prevista em lei, moléstia profissional ou acidente de serviço, terão proventos integrais (100% da remuneração). Quanto às doenças não especificadas que acarretem incapacidade para o trabalho, a modalidade é de proventos proporcionais ao tempo de contribuição.
Como primeiro exemplo da diferença entre o antes e o depois, basta imaginarmos que um servidor que teve diagnosticada neoplasia maligna (câncer) receberia a média remuneratória “correspondente a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde a do início da contribuição, se posterior àquela competência”, conforme prevê o artigo 1º da Lei 10.887/2004, com incidência apenas dos reajustes aplicados pelo RGPS aos seus benefícios.
Se o trabalhador se aposentou em 1º de julho de 2004 (120 meses desde 1º de julho de 1994 + 13º de cada ano) recebendo remunerações corrigidas de R$ 1000,00 na metade do período de aferição e R$ 3.000,00 na outra metade, o valor final dos proventos – 80% do período – corresponderia aos meses que entraram na conta (80% de 120 = 96 meses) com a remuneração de cada mês considerado.
Na hipótese, a soma seria dos 36 meses de R$ 1.000,00 que sobraram na primeira metade do tempo, mais os 60 meses de R$ 3.000,00, além dos valores de 13º pagos durante o período (3 de R$ 1.000,00 e 5 de R$ 3.000,00), totalizando R$ 2.437,50, ou seja, uma diminuição de 19% do que recebia na atividade. Além disso, seus proventos somente seriam reajustados quando houvesse reajuste dos benefícios do INSS, no mesmo percentual.
Como segundo exemplo, se fosse o caso de doença não prevista em lei, a redução seria proporcional ao seu tempo de contribuição. Se esse tempo fosse de 20 anos quando foi forçado a se aposentar e se tratasse de homem, a fração 20/35 seria aplicada e o valor final seria de R$ 1392,85, ou seja, uma redução de 54% do que recebia antes de ser aposentado por invalidez
Com a EC 70/2003, os proventos do primeiro exemplo apresentado voltam a ser de R$ 3.000,00, desde que o servidor tenha ingressado antes da EC 41/2003, vinculando-se aos reajustes ocorridos ao seu paradigma na carreira em atividade, que apresenta reestruturações normalmente superiores aos reajustes do RGPS. E no segundo exemplo, o valor seria de R$ 1714,28.
As alterações de agora foram fundamentais para evitar que grave retrocesso e lesão à segurança jurídica se perpetuassem, embora não se tenha aproveitado a oportunidade para alcançar aos prejudicados os valores retroativos, que certamente serão discutidos na via judicial.
Desde antes, várias ações coletivas a respeito apontavam a omissão legislativa que não deveria ser interpretada em prejuízo daqueles que são aposentados involuntariamente, no momento mais preocupante e menos desejado de suas vidas.
Com a EC 70/2012, o Congresso Nacional presta um tributo à justiça, reconhecendo que a sobreposição de números a pessoas para definir mudanças de regime jurídico, pautadas em índices econômicos, geram evidente prejuízo ao conceito maior de um Estado que se intitula Democrático e de Direito.